Há largas décadas que o Bairro de Santos, no centro de Lisboa, não era tão concorrido. A Associação de Moradores queixa-se da violência, do barulho até altas horas da manhã e exige que bares e discotecas encerrem às 23h00 da noite. Algo que não agrada aos empresários.
O velho tem vindo a dar lugar ao novo. Os edifícios históricos, marcados pelo desfiar do tempo, estão progressivamente a ser reabilitados. Há largas décadas que o bairro de Santos o Velho, no centro da capital, não era tão concorrido.
As ruas enchem-se de jovens à procura da diversão. O Largo de Santos e o Largo Vitorino Damásio são alguns dos locais que estão no olho do furacão. Desde que as restrições da pandemia desapareceram que a vida noturna regressou em força ao Bairro de Santos. Do outro lado da barricada, estão os moradores que vivem à beira de um ataque de nervos. Queixam-se do barulho, das enchentes nas ruas desde o início da noite até altas horas da madrugada. Quem aqui vive fala numa euforia pós-pandemia.
“Aqui na minha casa, nós temos dois quartos. Um deles fica virado para o Largo de Santos, mas só o conseguimos usar de domingo a quarta-feira. De quinta-feira em diante, eu e a minha mulher temos de nos mudar para o quarto de hóspedes que tem um isolamento acústico melhor. Caso contrário, não conseguimos dormir”. O desabafo é de Rodolfo Kussarev, morador no bairro há três anos.
O sossego e o direito ao descanso têm sido roubados de segunda a domingo. É o que diz a petição lançada pela recém-criada Associação de Moradores de Santos. Querem que os bares e discotecas do bairro lisboeta encerrem às 23h00.
“O que temos aqui é um excesso de consumo de bebidas, inclusivamente por menores de idade, o que acaba por gerar outros excessos até às 4h ou 5h o que impossibilita que tenhamos o nosso direito básico de dormir”, refere à Record TV, o vice-presidente da Associação de Moradores de Santos.
“Para as pessoas viverem assim não dá. Uns querem-se divertir, outros querem descansar porque no outro dia vão trabalhar”, diz uma moradora.
E no bairro, há mesmo quem adote truques para conseguir ter noites mais tranquilas. Marcelo, por exemplo, vice em Santos há 9 anos e recentemente usa um ventilador de ar frio, no inverno voltado para a parede e no verão voltado para mim. “Com isto eu não escuto barulho algum”.
Violência, barulho em excesso, ajuntamentos e até mesmo vandalismo, fazem parte do rol de queixas de um grupo de moradores que decidiu juntar-se e pedir a intervenção da Câmara Municipal de Lisboa. Garantem não estar contra a vida noturna no bairro, mas admitem que os problemas se agravaram e que a situação está mesmo fora de controlo.
O presidente da Junta de Freguesia da Estrela reconhece o problema e admite que é preciso reajustar e controlar os horários de funcionamento dos estabelecimentos de restauração que permanecem abertos até às 2h00. “O que tem impactado significativamente é o barulho na rua. Porque nestes locais existe um conjunto de estabelecimentos que a partir de certa hora mudam da atividade de restauração para uma espécie de primeiro bar de noite. O que acontece é que as pessoas criaram o hábito de ali permanecer enquanto não transitam para outros locais”, explica Luís Newton.

A zona de Santos tem vindo a mudar. Outrora, poucos eram os que queriam aqui assentar arraiais, mas nos últimos anos, o bairro transformou-se e atraiu novos moradores de outras zonas de Lisboa e até do mundo. No entanto, tudo mudou no ano passado, quando restauração e estabelecimentos de diversão noturna voltaram a funcionar como antes da pandemia.
Empresários recusam encerrar às 23h00
Djaló é gerente de um restaurante-bar no Largo de Santos, um estabelecimento que está aberto o dia todo. Mas é à noite que consegue faturar, Por isso, fechar às 23h00 é uma ideia pouco bem vinda.
A mesma resposta ouvimos do outro lado da rua onde fica o restaurante de Carla Carvalho. Está aberto há largos anos com licença para funcionar até às 2h00. “Isto sempre funcionou. Nós temos esta casa aberta há muitos anos e sempre esteve aberta até às 2h00, o barulho é mais ao fim de semana. É normal que os miúdos saiam à rua, conta a empresária.

Ao fim de dois anos de grandes prejuízos por causa dos efeitos da pandemia no setor da restauração, os empresários que conseguiram resistir não querem ouvir falar em fechar portas mais cedo, além de que teriam de despedir funcionários.
Eunice Gonçalves está prestes a abrir uma pizzaria em Santos e diz-nos que não fez contas para fechar o estabelecimento às 23h00, caso contrário não irá conseguir pagar a renda.
Morar num local onde todas as noites a vida noturna acontece, parece ser uma junção de ideias cada vez mais incompatíveis. A Junta de freguesia e os moradores defendem ser urgente estabelecer limites numa área que acolhe cerca de 1000 famílias
Insegurança e violência voltaram ao Bairro de Santos
As multidões estão de volta, assim como a insegurança, uma das grandes queixas destes moradores. Nos últimos meses, o Bairro de Santos tem sido palco de inúmeros casos de agressões violentas, confrontos que ficam manchados pela tragédia. Em março deste ano, o agente da PSP, Fábio Guerra foi brutalmente espancado à porta de uma discoteca na mesma zona. Faleceu dias depois. Não resistiu às graves lesões de que foi alvo.
Mas os episódios de violência entre jovens são uma constante, o que já levou ao reforço da polícia nos locais mais sensíveis.
Redesenhar o espaço público e regular comportamentos é o que os moradores pedem. O que já aconteceu ali ao lado na rua de São Paulo, na zona da Bica. A partir de dia 1 de agosto, os bares e restaurantes têm ordem da autarquia de Lisboa para encerrarem às 23h00 todos os dias da semana. A Associação de Santos já reuniu as assinaturas necessárias e em breve a petição vai ser encaminhada para a Câmara Municipal de Lisboa. Acreditam que a decisão seja replicada também aqui. Seja qual for a solução encontrada, certo é que nunca irá agradar moradores e empresários.