Emmanuel Macron foi o grande derrotado das últimas eleições Legislativas em França. A coligação do Presidente francês conseguiu 246 lugares parlamentares, menos 43 dos que seriam necessários para manter a maioria absoluta.

Um resultado que fica aquém do que o presidente francês quereria, mas surge como algo pouco surpreendente. A perda da maioria absoluta era uma realidade muito difícil de evitar.

“Seria sempre difícil porque Macron teve um mandado complicado, com a gestão da pandemia, da posição de França face à saída do Reino Unido da União Europeia, e, além disso, apanhou agora a fase desta gestão da guerra e da fadiga quanto ao conflito. Tudo isto terá ajudado pouco os eleitores”, explica Tiago Ferreira Lopes, professor de Relações Internacionais na Universidade Portucalense.

Podemos todos dissertar sobre os motivos que levaram ao mau resultado de Emmanuel Macron, mas especialistas acreditam que o seu maior inimigo foi ele próprio. “É obvio que a governação de Macron, a ideia de um sistema centrado na figura de Macron, não ajuda, porque ficou a impressão de que o Presidente francês é um democrata com poucas credenciais de negociação. E é sempre o problema das maiorias absolutas: a menor negociação”, afirmou o académico.

Negociações internas complicadas

Mas a derrota eleitoral é apenas o início do pesadelo do Presidente francês. Emmanuel Macron já iniciou negociações com os partidos com assento parlamentar, mas não tem a vida facilitada devido às poucas opções disponíveis.

Os dois maiores partidos da oposição são antagónicos ao bloco central de Macron que vê apenas disponível a direita tradicional, através dos Republicanos, que vivem, eles próprios, uma dicotomia interna, entre os moderados que poderiam fazer um acordo com o Presidente francês e a ala mais dura, que mantém a ideia de uma oposição forte.

“As opções são muito poucas. A mim parece-me que vamos ter um governo minoritário, que vai ter de negociar muito e dar novamente a centralidade ao Parlamento, que não tem há décadas”, explica Tiago Ferreira Lopes.

Sucesso absoluto à Direita

Uma eleição vive de vencedores e vencidos. Macron compõe o lado negativo, mas houve quem pudesse cantar vitória. E que vitória! O Rassemblement National (União Nacional), de Marine Le Pen, não passou do oito ao 80… foi melhor ainda. O partido passou de oito deputados para 89 nestas eleições.

França segue num impasse após eleições Legislativas
Marine Le Pen | © Lusa

Para Tiago Ferreira Lopes, a subida “meteórica” de Le Pen pode ser explicada pelo aparecimento de Éric Zemmour, afastado na primeira volta das eleições Legislativas.

“O partido de Marine Le Pen, o Rassemblement National, já não é visto como o partido mais violento da extrema-direita. É uma espécie de extrema-direita aceitável”, explica o professor. E acrescenta: “Com este novo candidato da extrema-direita, ele sim com um discurso mais visceral, Marine Le Pen aparece como uma extrema-direita civilizada.”

Resta saber o que fará a líder no Parlamento. “No seu discurso, Marine Le Pen diz que o partido vai ser oposição, mas não vai ser uma oposição destrutiva. Será uma oposição musculada, mas inteligente. Talvez abra a porta, no limite, a votar com o governo em algumas iniciativas legislativas”, afirma Tiago Ferreira Lopes.

Emmanuel Macron 

Do lado vitorioso, mas com menos impacto, podemos encontrar Jean-Luc Mélenchon, que liderou uma coligação à esquerda. O NUPES conseguiu 142 deputados, mas os partidos que a compõe não pretendem manter a união no Parlamento francês.

“A reorganização da esquerda, embora possa parecer um resultado interessante, não é um resultado particularmente bom. Estamos a falar de uma coligação de quatro partidos que consegue pouco mais de 140 deputados e sabemos que não irá compor um grupo parlamentar conjunto, ou seja, este grupo irá partir-se novamente nos partidos originais e a esquerda volta a ter vários pequenos partidos no Parlamento”, refere o professor.

Para o especialista, Mélenchon consegue uma vitória pouco estrondosa, mas eficaz naquele que era o seu principal objetivo: travar Emmanuel Macron.

Borne sem condições para continuar

A primeira-ministra francesa parece ser o elo mais fraco de todo este problema. Élisabeth Borne nomeada para o cargo a 16 de maio de 2022, depressa apresentou o pedido de demissão, após o desaire eleitoral. Emmanuel Macron não aceitou e por isso Borne continua no cargo, mas é possível, que não seja por muito tempo”, afirma.

França segue num impasse após eleições Legislativas
Élisabeth Borne | © Lusa

“Acho que a médio prazo, quando agora tudo isto estabilizar, seja destituída. Porque obviamente ela está muito fragilizada. Com este resultado –  não sendo culpa dela, porque juntou-se à equipa recentemente – a sua imagem fica manchada. Parece-me que até ao fim do ano civil teremos um novo primeiro-ministro em França”.

Ao contrário do que acontece em Portugal, a figura principal de um Governo continua a ser o Presidente, sendo este “o verdadeiro decisor”. Apesar de ser uma figura mais secundária, Tiago Ferreira Lopes acredita que Borne “não tem condições para continuar no cargo” e o próprio pedido de demissão mostra já como está “fragilizada”.

Novos desafios para Macron

Outra das incógnitas é a política externa e o que acontecerá como enfraquecimento da figura presidencial e uma vida política interna conturbada. Em termos de políticas europeias, estas podem ficar enfraquecidas tendo em conta o seu impacto na política interna em França.

No mais imediato, falando especificamente no conflito da Ucrânia, não são esperadas grandes alterações. “Na questão da guerra não me parece que vá ter um grande impacto, pelo menos para já. Porque esse é um dos poucos pontos na agenda que os vários partidos de grosso modo concordam”, explica Tiago Ferreira Lopes.

Macron é primeiro Presidente francês sem uma maioria absoluta desde a década de 1980. Não seria este um dos marcos que o Presidente queria alcançar, muito menos depois de estar habituado às comodidades de uma maioria absoluta.

França segue num impasse após eleições Legislativas
Emmanuel Macron | © Lusa

“Não vai ser fácil. Macron tem um cenário muito pouco simpático pela frente e vai ter de saber negociar muito bem. E Macron, ao contrário do que possa parecer, não tem um jogo de cintura negocial que outros líderes europeus têm. Porque ele entrou a governar em maioria absoluta, e, portanto, estava habituado a uma governação mais simples e agora essa simplicidade desapareceu”.

FONTE© Lusa