Foi no dia 21 de junho de 1948, numa conferência de imprensa em Nova Iorque, que a gravadora Columbia apresentou ao mundo um novo formato analógico de gravação e reprodução de música.

Na semana seguinte, começariam a ser comercializados os primeiros discos de vinil long play (LP), feitos a partir de microssulcos e com 30 centímetros de diâmetro, que garantiam 23 a 30 minutos de música em cada face.

Os anos (19)50 viriam a transformar os LP no principal meio de armazenamento de áudio graças aos desenvolvimentos registados. A gravação em alta-qualidade e a estereofonia tornavam o vinil no rei das vendas até meados dos anos (19)80.

Porém, o aparecimento dos compact discs, que conhecemos vulgarmente como CD, prometia um som mais limpo, claro e uma maior capacidade de armazenamento. Em 1986, nos Estados Unidos, as vendas de CD já ultrapassavam as de discos de vinil. E assim foi até 2014, ano em que de acordo com o ‘The Wall Street Journal’, foram vendidos mais de 9,2 milhões de discos de vinil, um crescimento de 53% em relação ao ano anterior.

Já em 2018, as vendas de CD desceram 42% e as de vinil aumentaram 12%. Nesse ano eram vendidos na América mais de 17 milhões de LP.

A procura ainda não atingiu o auge e continua a aumentar de ano para ano em todo o mundo, e Portugal não é exceção.

Numa grande superfície comercial de tecnologia e eletrónica, na região de Lisboa, a venda de discos de vinil tem aumentado de ano para ano. De acordo com os dados mais recentes, no ano passado registou-se um aumento de 50% face a 2018.

Inês Condeço, diretora de Marketing e Comunicação de uma cadeia de lojas de tecnologia e eletrónica, explica que são cada vez mais os jovens a aderir ao vinil.

“Obviamente que há aqui uma procura da geração entre os 45 e os 55 anos, portanto, um regresso ao passado, mas efetivamente assistimos a uma percentagem muito grande de jovens a partir dos 25 anos que procuram esta experiência musical”, diz.

Inês Condeço - O renascer do vinil
Inês Condeço | ©Record TV Europa

Em números, 31% dos consumidores têm entre os 45 e os 54 anos. Seguem-se os clientes entre os 35 e os 44 anos, que correspondem a 24% das vendas e a 21% entre os 25 e os 34 anos.

Vinil vs. streaming

A procura também duplicou nos canais online desta superfície. Vinte e cinco por cento das vendas eletrónicas correspondem hoje a discos de vinil: “É, claramente, a Fénix a renascer das cinzas e acho que tem muito a ver com o acelerar dos tempos, e em resposta a isso as pessoas precisam de ter um slow living, de perder tempo a conhecer o artista, a pôr o disco, a pôr a agulha, a ouvir o álbum. Quantas pessoas é que se sentam a ouvir um álbum? Normalmente estão a ouvir música enquanto fazem outras coisas, e eu acho que tem muito a ver com o acelerar das nossas vidas, e o vinil vem desacelerá-las e fazer com que demos mais valor à música, aos artistas e à arte que está ali presente. No fundo, não ser uma experiência tão efémera quanto é com o streaming.”

Jorge Dias vende discos de vinil desde 2007. É um apaixonado por música e vê no negócio uma forma de contribuir para que o formato não desapareça. Por esta loja de discos, novos ou em segunda mão, estão a passar cada vez mais jovens.

“Há definitivamente uma nova geração a interessar-se pelo vinil, que se calhar não teve contacto com ele quando ele estava em grande, nos anos de ouro do vinil, e agora está a interessar-se”, refere.

Uma das explicações para o aumento do interesse na compra de música neste formato analógico está na venda de leitores de gira-discos a preços mais acessível. Os chamados all-in-one.

O renascer do vinil
Jorge Dias | ©Record TV Europa

Para todas as idades

“Enquanto antes era só num sistema high fidelity (Hi-Fi) que se conseguia ouvir vinil, hoje em dia já existem vários equipamentos com bluetooth e colunas integradas, muito baratos, a partir dos 30, 40 euros, e que se consegue ouvir o vinil com muito boa qualidade. Com estética e design é um regresso ao vintage, que os jovens também apreciam. No fundo acaba por complementar toda a experiência de um reviver do passado. E a verdade é que estes novos equipamentos vieram democratizar novamente o vinil e a experiência”, explica Inês Condeço.

E se este é um incentivo para que mais jovens optem por consumir música neste formato analógico, para quem vende discos há 15 anos, há uma diferença grande no tipo de procura, como refere Jorge Dias.

“Malta mais nova é mais informada, ou pelo menos quando vem à procura de alguma coisa já sabe o que é que vem à procura, não vem comprar o disco para o ouvir pela primeira vez, já o ouviram, querem é tê-lo. Como têm menos poder de compra vão mais diretos ao que querem, e aos cromos que faltam na caderneta deles. Depois existe geralmente uma geração mais velha que gosta de acompanhar as tendências e o que vai saindo, e fazem questão de vir comprar o disco em vinil para o ouvir pela primeira vez, acompanhando os lançamentos.”

180 gramas de prazer

Carlos Parada dedica parte do seu tempo ao vinil. Está à frente de uma loja de discos em primeira mão e vê na qualidade do formato o segredo para o aumento da procura.

“São edições normalmente em vinil de formato 180 gramas, que consegue ter uma estereofonia com mais definição na sonoridade. A questão do som está relacionada com o áudio analógico. É como as bandas que vão para estúdio e gravam em bobines, porque o som analógico torna-se mais quente, é mais aprazível ao nosso ouvido. Já o digital acaba por perder informação que é percetível no áudio que ouvimos.”

Edições mais limitadas e com uma prensagem de qualidade obrigam ao aumento dos preços dos discos, o que faz do vinil uma verdadeira porta de entrada para o mundo do colecionismo.

Carlos Parada - O renascer do vinil
Carlos Parada | ©Record TV Europa

“É a criação de um património. Se calhar por isso é que os jovens hoje em dia voltam a gostar disto, porque se calhar também acham graça ter em casa aquilo que são os reflexos dos gostos deles, aquilo que eles cultivam naquele momento. Se tiverem só ficheiros no telemóvel, aquilo passa, um dia é um, outro dia é outro e isso passa”, afirma Jorge Dias.

Para Inês Condeço, “as pessoas que gostam da experiência mais física e ainda querem manter a compra do álbum e conhecer os artistas na sua plenitude acabaram por transferir essa experiência, que já não é tão rica com o CD, para o vinil.”

Clássicos e sucessos do momento

E nas coleções dos portugueses, estão presentes estilos de música que variam consoante a idade. “Há uma geração mais nova que procura as coisas mais revivalistas, desde os The Doors, aos Fleetwood Mac, ou Dire Straits…”, confessa Carlos Parada.

“Compram desde os clássicos da geração dos pais deles, como os Pink Floyd, até coisas que hoje em dia só mesmo uma nova geração é que ouve, como os Tyler The Creator ou os Artic Monkeys”, refere Jorge Dias.

Discos de vinil. Um formato que por tantas vezes já teve a morte anunciada. Mas será que é possível prever o seu fim?

“O vinil acabou por nunca morrer. Já havia os colecionadores de vinil que nunca deixaram de colecionar, através de edições novas que sempre saíram, e na parte do mercado usado, que sempre funcionou. Não tenho grandes dúvidas de que o mercado do vinil volte a crescer para números dos anos (19)80”, afirma Carlos Parada.

Som espacial

Jorge Dias explica ainda que “quem gosta gasta dinheiro nas coisas que gosta, e se as pessoas gostam de música, gostam de ter os seus discos. Portanto, vai existir sempre uma pequena margem de pessoas que vai gostar disso, e essa é a nossa aposta.”

São a sonoridade, o aspeto e o valor que tornam os discos de vinil num produto vitalício. Concebidos durante a segunda guerra mundial, estão hoje em casas de todo um mundo. A sua linguagem é universal e já fazem parte da cultura de todas as gerações.

Mas se acha que só na Terra é possível ouvir um disco de vinil, então está enganado. A 20 mil milhões de quilómetros de distância do nosso planeta estão os Golden Records. Dois discos de vinil a bordo das sondas espaciais Voyager 1 e 2 e que incluem seleções musicais de diferentes culturas e eras, para que extraterrestres possam conhecer o que nós por cá ouvimos.

FONTE© Record TV Europa