Desalojado antes de fazer anos, Agostinho volta a sorrir

Desalojado antes de fazer anos, Agostinho volta a sorrir

Mais de 39 mil pessoas foram afetadas pela chuva intensa que se abateu sobre a região de Maputo nas últimas semanas.

Agostinho Fátima perdeu tudo devido às inundações que sitiaram o município de Boane nas vésperas do seu aniversário e, embora agora desalojado, a festa foi feita pelas pessoas que com ele sobreviveram à fúria da água em Maputo.

“A data do meu aniversário foi quase nula para mim neste ano”, lamenta à Lusa o jovem comerciante, ao lado de dezenas de pessoas desalojadas e que foram acolhidas na Escola Secundária Joaquim Chissano em Boane, a pouco mais de 30 quilómetros do centro de Maputo.

O homem está entre as mais de 39 mil pessoas afetadas pela chuva intensa que se abateu sobre a região de Maputo nas últimas semanas, provocando pelo menos nove mortos e bloqueando diversas vias, incluindo a estrada principal entre a capital e o município de Boane (EN2).

A situação obrigou a barragem dos Pequenos Libombos, que abastece Maputo, a abrir as comportas para poder manter capacidade de encaixe, agravando a situação hidrológica em redor de Boane.

“Nós perdemos tudo”, relata Agostinho, que tinha a sua casa a quase 100 metros de um rio num bairro de Boane.

“O rio cuspiu a água”, descreve o jovem comerciante, que fugiu com a mulher quando percebeu que a sua casa estava completamente submersa.

No dia em que celebra 35 anos, Agostinho soma seis dias desde que foi acolhido no centro criado na Escola Secundária de Boane, onde as aulas estão suspensas, e lamenta porque não pôde realizar a festa com a qual tanto sonhou em sua casa, embora não tenham faltado outros desalojados a felicitá-lo.

“Eu gostaria de ter recebido flores e presentes. Não estou feliz, estaria em casa a comemorar a data de hoje”, lamenta.

Como Agostinho, no centro de acolhimento da Escola Secundária Joaquim Chissano, centenas de famílias foram abrigadas, mas falta comida para todos, apesar dos esforços da Organização da Mulher Moçambicana, ala feminina do partido no poder (Frelimo) que está a preparar voluntariamente as refeições doadas por organizações e cidadãos.

“A situação é complicada. Hoje, por exemplo, só tivemos uma refeição [chá e pão]. O almoço provavelmente vai ser servido por volta das duas da tarde. Não sabemos se teremos o jantar”, explicou Sérgio Sambo, 36 anos, outro desalojado devido às intempéries em Boane.

Os esforços de várias entidades, incluindo organizações não-governamentais, são visíveis no terreno, mas são inúmeras as pessoas que precisam de ajuda, numa altura em que as autoridades alertam que o mau tempo pode continuar em Maputo.

“Não temos onde dormir. Estamos a dormir no chão nas salas de aulas”, conta à Lusa Gilda Luís, uma mãe de um recém-nascido que só conseguiu sair de casa com o filho e uma pasta na trágica manhã de sexta-feira.

Além da fome, o risco de doenças associadas à época chuvosa também é uma preocupação para as autoridades, num momento em que um surto de cólera afeta algumas províncias moçambicanas, incluindo Maputo.

O apoio psicossocial também é assumido como uma prioridade, na medida em que a maior parte das famílias afetadas vive no limiar da pobreza e, com as inundações, perdeu o pouco que tinha

As inundações são recorrentes nesta altura do ano em Moçambique, que está em plena época das chuvas, mas, ainda assim, a pluviosidade tem estado acima do esperado.

Entre outubro e abril, Moçambique é ciclicamente atingido por cheias, fenómeno justificado pela sua localização geográfica, sujeita à passagem de tempestades e, ao mesmo tempo, a jusante da maioria das bacias hidrográficas da África Austral.