Tímido e solitário por natureza, o lince-ibérico é o felino mais ameaçado em todo o mundo e o carnívoro em maior perigo na Europa. O seu desaparecimento acelerado e a consequente pré-extinção levaram ao incremento, em Portugal e Espanha, de programas e políticas de preservação da espécie.
O sol começa a descer no céu e o estômago diz-lhe que se aproxima a hora da refeição. A fome aperta, é preciso vaguear em busca de alimento e, apesar de ser um caçador exímio, capaz até de trepar árvores ou atravessar a nado grandes cursos de água, não é adepto de longas perseguições.
Prefere ficar de tocaia, durante horas intermináveis se preciso for, emboscado atrás de uma qualquer pedra ou arbusto, à espera de que a presa se acerque o suficiente para a poder apanhar em poucos passos.
É um predador paciente, dotado de ótimos reflexos, ciente de que, mais tarde ou mais cedo, vai surgir um coelho desprevenido que lhe servirá de jantar. Especializou-se em caçar coelhos-bravos, são o seu petisco favorito, mas teve de habituar também o paladar a lebres, roedores e até aves, pois os coelhos começaram a escassear: ouviu rumores de que estavam a ser dizimados por doenças.
Os seus grandes rivais de caça, a raposa vermelha e o gato-bravo, também deambulam nos arredores em busca de alimento, consegue farejá-los, mas vale-se da sua audição perfeita e visão apuradíssima – não foi por acaso que nasceu a expressão ‘olho de lince’ – para lhes levar a melhor.
Territorial e inibido
Aprecia a solidão, aquele isolamento em que vive, o espaço a que gosta de chamar seu. A natureza tímida só é vencida quando chega a época do acasalamento. Afinal de contas, é um ‘gato’ bem garboso: grandes orelhas peludas, pernas ágeis e longas, cauda curta, corpo sarapintado e um colar de pelo, semelhante a uma barba, que é o seu orgulho.
Já foi pai de várias ninhadas, mas nunca participa na educação das crias, o seu temperamento solitário não o motiva a constituir família. Nos últimos anos, tem vindo a notar uma maior dificuldade em encontrar companheiras para reprodução, aos ouvidos chegaram-lhe termos como ‘extinção’, ‘cativeiro’ e ‘reintrodução’, demasiado complexos para conseguir assimilar o seu significado.
Também notou que algo de errado se andava a passar com o seu território, quando os muito apreciados medronheiros, zimbros e sobreiros foram substituídos por eucaliptos e pinheiros-bravos ou, pior ainda, por estradas onde circulam autênticas armas mortíferas, às quais alguns dos companheiros de espécie sucumbiram.
O lince-ibérico suspira tristemente, mas um ligeiro restolhar apenas a uns metros de si traz de volta o predador. Aciona de imediato os instintos de caçador, o corpo fica tenso, em alerta. Um destemido coelho aventura-se sorrateiramente e o felino respira de alívio – pelo menos esta noite terá jantar.
À descoberta do lince-ibérico
Descrição
Aspeto geral semelhante ao de um gato de cauda curta. Apresenta um colar de pelo que cresce com a idade, orelhas com tufos de pelos negros nas extremidades, dorso e membros de cor castanho-amarelada com manchas pretas.
Alimentação
O coelho-bravo constitui a maior parte da sua dieta, que também inclui lebres, roedores, jovens veados e aves. Um macho come um coelho por dia e uma fêmea grávida precisa de comer três.
Reprodução
A época do cio ocorre sobretudo em janeiro e fevereiro. O típico período de gestação dura cerca de dois meses e uma ninhada consiste normalmente em duas ou três crias.
Longevidade
Cerca de 15 anos em liberdade e 20 em cativeiro.
Habitat ideal
Matagal e bosque mediterrânico, onde se misture a agricultura e a pastorícia.
Fatores de ameaça
Destruição, degradação ou fragmentação de habitats, perseguição pelo homem e escassez da sua principal presa natural, o coelho-bravo.
Medidas de conservação
Restauro do seu habitat nativo, manutenção da população de coelhos selvagens, redução de causas não naturais de morte e reprodução em cativeiro para posterior libertação na natureza.