Rio Maior é uma cidade virada para o desporto. Com cerca de nove mil habitantes conta com várias imediações desportivas, entre elas, cerca de cinco pavilhões de basquetebol, características ideais para a criação da primeira Academia de basquetebol em Portugal.

“A academia é um processo que vem desde a criação da marca, neste caso a marca MVP Academy em 2008. De 2008 a 2016 fez uma serie de eventos sazonais, pelo país e fora do país. Há medida que fomos andando neste projeto fomos percebendo que havia espaço para a criação de uma coisa nova em Portugal. Deriva também da minha experiência de treinador no estrangeiro. Em 2016 começamos a elaborar o plano teórico para fazer esta estrutura que partiu depois em 2019. A premissa passa muito por uma prova de conceito de duas coisas: uma delas de perceber se a questão académica e do alto rendimento podem estar juntos lado a lado e podem ter ambos rendimento. E a segunda: dar mais horas de treino, mais volume de treino numa estrutura com diferentes competências na pré-competição”, explica Nuno Tavares, treinador.

Nuno Tavares
Nuno Tavares | © Record TV Europa

É praticamente desde o início que Filipe Torres está na academia. Começou por participar nos torneios, antes do arranque da estrutura e assim que teve idade para integrar o projeto não quis perder a oportunidade.
“Eu comecei a jogar basquetebol por influência da minha irmã. Quando experimentei não quis outra coisa. Desde aí até agora tem sido basquetebol a minha vida”, conta Filipe Torres.

Por mês, os atletas pagam entre 600 a 800 euros com alimentação e alojamento incluídos. Nuno Tavares afirma que são aceites jovens desde o 10º ao 12º ano, há o “próprio recrutamento e também há a tletas que nos contactam e depois também através dos nossos torneios identificamos um ou outro atleta. Do primeiro ano para este ano, a base de dados foi muito alargada de atletas que participavam nos nossos eventos e neste momento esses atletas são a minoria que temos aqui.”

Neste momento, a academia conta com 30 atletas. 22 rapazes e 8 raparigas. Nenhum dos futuros basquetebolistas é de natural de Rio Maior. São de norte a sul do país e há também um atleta do Canadá, um suíço, três angolanos e dois cabo-verdianos. A academia acaba por tentar dar o suporte familiar as estes jovens que estão longe do conforto de casa.

“Nós vivemos a nossa vida aqui, os nossos colegas acabam por ser a nossa família. Passamos o dia com eles, vamos às aulas, Fazemos a nossa vida de estudante, mas um bocado com mais treinos porque o nosso objetivo é o basquetebol e assim sabemos que vamos conseguir la chegar”, confessa Filipe.

Filipe Tavares
Filipe Tavares | © Record TV Europa

A academia tem também dois psicólogos desportivos que têm sessões individuais a cada 15 dias, que têm sessões de grupo todos os meses e esta gestão de expectativas acaba por ser acompanhada por eles.

No último ano, o basquetebol ganhou mais notoriedade em Portugal, depois de Neemias Queta ter chegado à NBA. Muitos jovens começaram a acreditar que era possível, e que podiam seguir as pisadas do atleta do Vale da Amoreira, na Moita.

Belchior de Brito está mais perto desse sonho. Natural de Angola, está há dois anos na Academia, e no próximo ano letivo ruma aos Estados Unidos onde, através de uma bolsa de estudo, vai ter a oportunidade de continuar a estudar e a jogar basquetebol.

“Nunca passou pela minha cabeça que isto fosse acontecer. Eu pensava que ia fazer o 12 aqui e depois ia para uma universidade portuguesa. Nunca me passou pela cabeça ir para os estados unidos. Nunca pensei que a Academia ia abrir os meus horizontes assim tanto. A academia mudou a minha forma de pensar e de ser drasticamente”, explica Belchior de Brito

Quem ouve hoje Belchior nem imagina que o basquetebol surgiu por acaso na vida do jovem atleta em 2019 quando estava em Angola de férias e foi convidado por um amigo a ir jogar basquetebol, “nesse encontro conheci um treinador de basquetebol e ele disse me algumas palavras sobre basquetebol relacionadas com a bíblia e eu fiquei encantado. Tive a vontade de desenvolver me no mundo do basquetebol. Fui para o Montijo basquetebol onde fiquei um mês em formação. Não jogava, mas deu para aprender o básico. Entretanto chegou a covid e ficamos todos em casa, eu decidi não ficar parado porque estava demasiado aborrecido em casa, ia para os campos como estavam vazios e fui aprendendo a jogar sozinho. Falei com o meu pai e disse lhe que queria perseguir com o basquetebol e disse que se era para apostar, vamos apostar”

Não foi só desportivamente que Belchior teve sucesso, pessoalmente o crescimento também é notório. Através das redes sociais descobriu o projeto da MVP Academy e decidiu mostrar ao pai.

“O meu pai ficou impressionado e secretamente teve a trabalhar em dois sítios para eu conseguir vir para aqui. O resto foi magia. Se não fosse o basquetebol eu não estaria a funcionar. Foi uma bóia de salvação certamente. Antes do basquetebol eu estava sempre em casa e não fazia nada. Só convivia com a minha irmã. O basquetebol fez me conhecer estas pessoas maravilhosas que estão aqui. E hoje em dia já posso dizer que convivo mais com outras pessoa, já sou mais sociável, confessa Belchior.

Belchior de Brito
Belchior de Brito | © Record TV Europa

Até ao fecho desta reportagem, mais um atleta ganhou uma bolsa de estudo para ir para os Estados Unidos. Trata-se de Nadelly Santos que entrou numa Universidade em Miami onde vai completar o percurso académico e desportivo. Desde o início da academia, cinco alunos seguiram o sonho americano. Para a Europa, também seguiram atletas, neste caso, dois para Itália e dois para o Reino Unido.

É também para o velho continente que quer seguir Filipe. O jovem de 16 anos, natural de Aveiro tem o sonho de jogar na EuroLeague, a maior competição de basquetebol na Europa.

O dia a dia destes atletas é bastante preenchido. Começam a treinar às seis da manhã onde a sessão é dedicada à preparação física ou a lançamentos. Depois há um período de aulas nas escolas em Rio Maior. Na hora de almoço têm um treino técnico, voltam às aulas e às 18horas têm mais treino coletivo. Um dia bastante preenchido devido à carga horário de um estudante do ensino secundário em Portugal.

“Eu já trabalhei em vários países que quando me perguntam qual é a diferença em Portugal, eu digo sempre que é o horário escolar, que é algo que não tem nada a ver com a escola. Nós somos os país, quando falamos na OCDE que tem mais horas escolares e isto é uma carga muito grande para estes atletas. Se olharmos para países como Itália que temos da primeira classe ao 12.º às 13h e têm todas as tardes livres”, explica Nuno.
A este desfio de gestão de tempo, juntam as expetativas. Nuno diz que os jovens de 14/15 anos chegam a Rio Maior cheios de sonhos e que têm de aprender a ter um plano B porque se “eu disser a um atleta, tu vai ser profissional de basquetebol aos 15 anos estou a criar um sonho que eu não tenho controlo se vai ser ou não e nem penso que o devo fazer. O que nós fazemos é fazer ver o atleta e os encarregados de educação que estes anos que eles estão cá, estão a criar uma base muito sólida que é a parte desportiva e académica e toda a parte fora do campo enquanto estrutura enquanto pessoas que é para quando derem o próximo passo após o 12.º”

Num país virado para o futebol, começam cada vez mais a dar nas vistas atletas de outras modalidades. Seja na NBA, na Euroliga ou até noutro campeonato de basquetebol, pode estar nesta academia o próximo Neemias Queta que vai elevar o nome e as cores de Portugal. Para já, vivem o sonho.

FONTE© Record TV Europa