2023: Património cultural reorganizado após anos de espera com setor na expectativa

2023: Património cultural reorganizado após anos de espera com setor na expectativa

“Desenvolver a oferta pública de museus e monumentos nacionais, e flexibilizar o seu modelo de gestão, com maior autonomia”.

As Grandes Opções do Plano para 2016-2019 já o previam, embora de forma vaga, numa medida entre muitas: “Desenvolver a oferta pública de museus e monumentos nacionais, e flexibilizar o seu modelo de gestão, com maior autonomia”.

Em 2017, o então ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes, dizia no parlamento que pretendia criar um instituto público para os museus e monumentos, porque a DGPC era “uma estrutura disforme”.

“A DGPC tem dado resposta aos problemas com as limitações que tem, com uma estrutura disforme que tem. Não compreendo que os museus sejam direções de serviço ou subdireções gerais. Não entendo que não tenham um grau de autonomia”, afirmou o ministro, fazendo eco, com esta última frase, das reclamações de múltiplos diretores de museus e de associações da área ao longo de anos.

O novo instituto público – de nome Património Cultural – só vai nascer no dia 01 de janeiro de 2024, sob direção do atual diretor-geral do Património Cultural, João Carlos dos Santos, dedicado à gestão e salvaguarda do património cultural classificado ou em vias de classificação, tendo sob sua alçada o Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática, o Laboratório de Arqueociências, o Forte de Sacavém, as Bibliotecas e os Arquivos de Arqueologia, e o Fundo de Salvaguarda do Património Cultural.

A par deste vai nascer a entidade pública empresarial Museus e Monumentos de Portugal (MMP), dirigida pelo antigo presidente do Teatro Nacional São João Pedro Sobrado, responsável pelos museus, palácios e monumentos nacionais que têm à sua guarda tesouros nacionais, coleções de referência, e pelos monumentos ou conjuntos inscritos na Lista do Património Mundial da UNESCO.

Aquando da apresentação da reorganização do setor, em junho, o ministro Pedro Adão e Silva disse que a criação da empresa pública servirá para que os diretores dos museus e monumentos consigam aumentar receitas e terem mais recursos na gestão.

O anúncio da reorganização foi acompanhado por expectativas positivas de grande parte do setor, embora com dúvidas por esclarecer e ressalvas de que será preciso ver o que vai acontecer a partir de janeiro.

Até junho, vão ainda ser lançados os concursos para as direções dos equipamentos integrados na MMP, no Laboratório José de Figueiredo e na Coleção de Arte Contemporânea do Estado, apesar de recentemente terem sido realizados concursos internacionais para os museus. No caso do Museu Nacional de Arte Antiga nem chegou a abrir.

No parecer dado pela secção portuguesa do Conselho Internacional dos Museus (ICOM-Portugal), logo em julho, podia ler-se que “esta reforma, em boa hora proposta, pode e deve ser o motor de criação das condições de um desenvolvimento descentralizado, que assegure a coesão nacional e a igualdade de oportunidades dos portugueses em todo o território”.

No entanto, o ICOM-Portugal colocava um conjunto de 16 questões sobre as ações futuras das duas novas entidades, alertando, por exemplo, para o caráter problemático de algumas funções da MMP “pela natureza empresarial desta estrutura”, crítica lançada por partidos como o Partido Comunista Português já aquando do novo regime de autonomia dos museus e agora repetida.

De igual modo, o ICOM-Portugal questionava-se sobre o futuro da Rede Portuguesa de Museus (RPM), alvo de uma proposta de revitalização pelo Governo, mas omissa “da eventualidade de implementação das conclusões do estudo, reflexão e propostas plasmadas no documento desenvolvido pelo Grupo de Trabalho sobre a RPM”.

Já a secção portuguesa do Conselho Internacional dos Monumentos e Sítios (ICOMOS-Portugal) realçou, no seu parecer, também do começo de julho, que museus e monumentos não deviam estar reunidos na mesma empresa, dando um olhar crítico às mudanças.

“Não nos parece claro que a criação destes dois organismos, I.P. e E.P.E., tal como se apresenta nos diplomas [propostos], seja benéfica para a gestão de monumentos, conjuntos e sítios e não tenha consequências desastrosas para o património nacional e mundial, tanto mais que terão de ser duplicados serviços/departamentos alocando funcionários que neste momento são escassos”, podia ler-se no texto, que alertava, como outros, para a passagem de competências das direções regionais de Cultura – a serem extintas – para as Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional e municípios.

A Ordem dos Arquitetos, por exemplo, partilhava das mesmas reservas: “Tendo em conta a extinção das Direções Regionais de Cultura e a diluição das respetivas competências nas novas estruturas das CCDR, parece terem daí resultado fragilidades que colocam sérios riscos quanto à qualidade da atuação do Estado no domínio da salvaguarda do património arquitetónico, urbano, paisagístico e arqueológico”.

Por seu lado, o Sindicato de Trabalhadores de Arqueologia (STArq) chamou a atenção para “as muitas necessidades de recrutamento de trabalhadores em Arqueologia, já amplamente diagnosticadas e em permanente agravamento na DGPC e nas DRC, [que] serão consideravelmente ampliadas, ao nível de todos os serviços públicos envolvidos nesta reforma”.

Em particular, o STArq tem vindo a realçar o caso do Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática (CNANS), que “entrará em rutura”, segundo o sindicato, caso não se dê a contratação de novos arqueólogos para o serviço.